Talkin' about love is like dancin' about architecture... but it ain't gonna stop me from trying.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Bilhete livre-trânsito

Alexis Bledel, America Ferrara, Amber Tamblyn e Blake Lively (The Sisterhood of the Traveling Pants)
Quando era pequena, com maior ou menor facilidade, acabava por partilhar tudo com as minhas amigas. E não falo de brinquedos, doces e cromos de caderneta; falo de segredos, pensamentos e sonhos, por mais infantis e ridículos que fossem (facto ainda mais natural dada a idade que tinha na altura, pois claro).

À medida que fui crescendo, tive fases de ir de um extremo ao outro. No período mais difícil que atravessei, fechei-me em copas, não partilhava nada com ninguém a não ser comigo mesma (até que me fartei de ouvir a minha própria voz dentro da minha cabeça). Isso aconteceu não só porque era a plena adolescência, mas também porque julgava que ninguém iria compreender.

Passando essa fase, vendo a vida de um prisma mais positivo e afins, fui retomando a confiança, fui partilhando mais, escondendo-me menos, tendo menos segredos para aquelas pessoas que considerava mais especiais. Não havia nada que escondesse de quem considerava meu amigo. Até que essa confiança passou uma prova em demasia e se esfumou, do dia para a noite. E tornou-se quase impossível voltar a confiar em alguém daquela forma plena, sem barreiras e sem qualquer segredo só meu, como fazia quando era criança.

Parece que, nessa altura, uns poucos seleccionados (os "melhores amigos") recebiam um bilhete especial de acesso total, um livre-trânsito; a essas pessoas eu confiava tudo. E tinha a capacidade de ir distribuindo mais passes de livre-trânsito a novas pessoas que conhecia, pessoas essas que entravam então nesse círculo especial dos amigos mais importantes.

Hoje já não consigo fazer isso. Quem ganhou aquele livre-trânsito no Passado e o soube manter, continua a manter todos os privilégios que a condição de "melhor amigo" apregoava; quem o perdeu, perdeu-o em definitivo.

A questão maior são as novas entradas na minha vida; por muito que queira e que ache que o merecem, não consigo voltar a distribuir bilhetes especiais a mais ninguém. Desapareceram com o aproximar da vida adulta (ou, mais provavelmente, com as decepções que sofri e a dor que me provocaram). Caducaram, são produtos retirados do mercado, "cromos" da Caderneta do Nuno Markl, fósseis pré-históricos, lendas que se contam às crianças. São algo que não penso conseguir voltar a dar a alguém. Pelo menos, não sem uns quantos anos a comprovarem o merecimento de tais cartõezinhos de acesso total.

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